![Rumando para A Tempestade [Conto] Por do Sol em Jericoacoara](https://untitled.com.br/wp-content/uploads/2012/04/cultura-abril2012-008-535x400.jpg)
– Em frente marujo!
A ordem pegou-o de surpresa.
– Estamos rumando em direção à tempestade, capitão!
A voz do marujo era trêmula, as ondas aumentavam, o vento já castigava as velas. Os monstros marinhos beliscavam o convés.
– Eu disse em frente! Terra firme é sempre após a tempestade!
E o marujo, ainda hesitante, foi preparando as velas, enquanto via o vulto de ondas gigantes formando-se no horizonte escuro.
– A embarcação é pequena capitão. Não conseguiremos atravessar as ondas. Seremos engolidos pelo mar! Ou algo pior! Ainda temos tempo de dar meia volta!
O Marujo temia tudo a essa altura. O Mar, a chuva, o vento, os monstros que ele tanto ouvira falar. Nada mais poderia lhe fazer acreditar que conseguiriam.
– Seguiremos!
Disse convicto o capitão. Que soava confiante apesar do olhar nervoso e concentrado que lançava ao horizonte enquanto mantinha o leme firme e a nau no prumo, no rumo.
– …
E o silêncio do marujo não era nada senão puro terror.
Algumas horas, ou dias, ou anos passaram-se para que a embarcação conseguisse cruzar a tempestade. Mas, eventualmente tudo deu certo. Algumas velas com pequenos rasgos. Um mastro trincado. Mas tudo estava bem. A Nau seguia em mar aberto e navegando em frente. Fosse frente qualquer direção, já que não existem pontos de referência no horizonte do oceano.
– Capitão. Como é estar convicto de algo tão incerto como navegar por uma tempestade? Como imaginar terra firme chegando quando olhamos para frente e só enxergamos nuvens escuras? Como é possível não temer os monstros marinhos ?
O marujo estava calmo, aliviado. Sentia-se grato por estar vivo, e na verdade, nunca sentira-se tão vivo.
– Veja marujo, não há como saber, eu nunca estive convicto do nosso sucesso, mas tinha certeza que devíamos enfrentar nosso destino. Só o que podemos é sonhar. Sonhamos que tudo ficará bem. Colocamos nossa fé nos deuses que protegem os navegantes, seguramos firme o leme e seguimos. Navegar é o importante marujo, navegar em frente…
A voz do capitão era calma, quase doce. Ele soava paternal e ao mesmo tempo tão próximo, que era como se o próprio marujo estivesse pronunciando as palavras.
– Mas capitão, desculpe-me. Não consigo acreditar. Poderíamos ter tentado voltar. O mar parecia mais calmo olhando para trás. Poderíamos tentar atracar naquele porto anterior se chegássemos antes da tempestade!
O marujo era inquisidor, gostava de racionalizar. Era curioso apesar de ser medroso. O capitão gostava disso. E pensou por alguns instantes, em silêncio, antes de responder.
– Meu bom marujo. Essa tempestade iria nos alcançar… Ou, eventualmente, acabaríamos enfrentando outra. Sempre haverão tempestades, qualquer que seja a direção. Tempestades, e monstros, e ondas, e ventos. Voltar não significa estar seguro, voltar também é uma direção a se navegar, só que não nos leva a lugar nenhum senão os que já estivemos.
O capitão tomou fôlego, deu um trago de rum, pensou mais um pouco e concluiu.
– Existem as calmarias e as tempestades. E o sentido de tudo é sempre navegar marujo. Levar essa nau ao próximo porto, encontrar terra firme. E terra firme é sempre em frente, sempre logo após a linha do horizonte. Controlamos o leme, ajustamos as velas, contornamos as ondas e navegamos. Pois o mar, esse nós nunca haveremos de controlar…
O marujo sentiu os raios do sol nascente brotando no mar, tocando seu rosto. Olhou para o sol logo em frente, na direção em que seguiam. E teve certeza que terra firme estaria mesmo logo adiante. E sentiu-se feliz por poder navegar…
(Esse é um conto autobiográfico, que fala de minha vida no último um ano… e talvez no futuro também. Mas acho que serve para todos de alguma maneira, ou em algum momento. Nós somos a nau. Nosso cérebro, racional, é o marujo. Nosso coração, nosso espírito, é o capitão. E a vida… a vida é o mar por onde haveremos de navegar.)
29 de Abril de 2012 at 12:24
Conto Fantástico!
Fica uma lição muito importante para mim…espero leva-la comigo.
29 de Abril de 2012 at 12:39
Arthur,
Obrigado.
Se for-me possível, com algumas palavras, ajudar quem quer que seja a entender melhor o mundo e ter um pouco de esperança, serei um escritor realizado.
Abraços,
Guilherme
23 de outubro de 2012 at 23:46
Obrigada Guilherme, você não escreve, você psicografa sentimentos vivos.
23 de outubro de 2012 at 23:58
Debora,
Novamente, agradeço o elogio!
Abraço